domingo, 20 de novembro de 2011

A grande voz - Vinicius de Moraes


É terrível, Senhor! Só a voz do prazer cresce nos ares.

Nem mais um gemido de dor, nem mais um clamor de heroísmo

Só a miséria da carne, e o mundo se desfazendo na lama da carne.

É terrrível, Senhor. Desce teus olhos.

As almas sãs clamam a tua misericórdia.

Elas crêem em ti. Crêem na redenção do sacrifício.

Dize-lhes, Senhor, que és o Deus da Justiça e não da covardia

Dize-lhes que o espírito é da luta e não do crime.

Dize-lhes, Senhor, que não é tarde!

Senhor! Tudo é blasfêmia e tudo é lodo.

Se um lembra que amanhã é o dia da miséria

Mil gritam que hoje é o dia da carne.

Olha, Senhor, antes que seja tarde

Abandona um momento os puros e os bem-aventurados

Desvia um segundo o teu olhar de Roma

Dá remédio a esta infelicidade sem remédio

Antes que ela corrompa os bem-aventurados e os puros.

Não, meu Deus. Não pode prevalecer o prazer e mentira.

A verdade é o Espírito. Tu és o Espírito supremo

E tu exigiste de Abraão o sacrifício de um filho.

Na verdade o que é forte é o que mata se o Espírito exige.

É o que sacrifica à causa do bem seu ouro e seu filho.

A alma do prazer é da terra. A alma da luta e do espaço.

E a alma do espaço aniquilará a alma da terra

Para que a Verdade subsista.

Talvez, Senhor meu Deus, fora melhor

Findar a humanidade esfacelada

Com o fogo sagrado de Sodoma.

Melhor fora, talvez, lançar teu raio

E terminar eternamente tudo.

Mas não, Senhor. A morte aniquila - ao fraco a morte inglória.

A luta redime - ao forte a luta e a vida.

Mais vale, Senhor, a tua piedade

Mais vale o teu amor concitando ao combate último.

Senhor, eu não compreendo os teus sagrados desígnios.

Jeová - tu chamaste à luta os homens fortes

Tua mão lançou pragas contra os ímpios

Tua voz incitou ao sacrifício da vida as multidões.

Jesus - tu pregaste a parábola suave

Tu apanhaste na face humildemente

E carregaste ao GóIgota o madeiro.

Senhor eu não os compreendo, teus desígnios.

Senhor, antes de seres Jesus a humanidade era forte

Os homens bons ouviam a doçura da tua voz

Os maus sentiam a dureza da tua cólera.

E depois, depois que passaste pelo mundo

Teu doce ensinamento foi esquecido

Tua existência foi negada

Veio a treva, veio o horror, veio o pecado

Ressuscitou Sodoma.

Senhor, a humanidade precisa ouvir a voz de Jeová

Os fortes precisam se erguer de armas em punho

Contra o mal - contra o fraco que não luta.

A guerra, Senhor, é em verdade a lei da vida

O homem precisa lutar, porque está escrito

Que o Espírito há de permanecer na face da Terra.

Senhor! Concita os fortes ao combate

Sopra nas multidões inquietas o sopro da luta

Precipita-nos no horror da avalancha suprema.

Dá ao homem que sofre a paz da guerra

Dá à terra cadáveres heróicos

Dá sangue quente ao chão!

Senhor! Tu que criaste a humanidade.

Dize-lhe que o sacrifício será a redenção do mundo

E que os fracos hão de perecer nas mãos dos fortes.

Dá-lhe a morte no campo de batalha

Dá-lhe as grandes avançadas furiosas

Dá-lhe a guerra, Senhor!

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